No primeiro quadrimestre do ano, foram abertas 820,8 mil vagas formais pagando até três salários mínimos, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), mas como nas faixas salariais seguintes o saldo entre demitidos e admitidos foi negativo, o total de novos empregos no país ficou 2,8% menor e somou 797,7 mil no período. A parcela positiva de empregos entre dois e três mínimos, contudo, foi ínfima - apenas 172 vagas.
O começo de 2011 manteve, portanto, o padrão de geração de vagas dos últimos anos, absolutamente concentrado nas faixas de menor remuneração (até dois salários mínimos), apesar do constante alarde feito por empregadores sobre a necessidade de mão de obra qualificada.
A formalização do emprego, o aumento da oferta de vagas e os constantes reajustes do salário mínimo podem explicar por que o saldo positivo de postos de trabalho com carteira assinada continua concentrado nas faixas que vão até dois mínimos, concordam analistas consultados pelo Valor. No substrato que vai de três a quatro mínimos, o saldo de vagas criadas nos primeiros quatro meses de 2011 chega ao máximo de 16.162 postos cortados, sendo menor nos grupos seguintes.
No mesmo período do ano passado, quando foram criados 962,3 mil postos com carteira assinada, a tendência observada foi igual: o saldo de vagas nas faixas de meio a dois salários superou o total do quadrimestre em 14%, ao passo que as faixas de dois a mais de 20 mínimos registraram saldo negativo de 25,7 mil postos.
Se em 2009 - ano em que o Brasil sentiu o efeito da crise financeira - a principal explicação para a má qualidade das vagas formais criadas eram as demissões de cargos mais altos para que as empresas reduzissem os custos de suas folhas de pagamento, agora analistas avaliam essa estatística como algo não passageiro, mas sim inerente à economia brasileira, que cresce apoiada no setor de serviços e em salários menores, como qualquer país emergente.
"O salário mais baixo tem a ver com a estrutura ocupacional que está gerando postos de trabalho. Esse dado desnuda o quão longe ainda estamos de ser um país desenvolvido", diz Sérgio Mendonça, supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). O economista destaca que os principais setores contratantes da economia são os que pagam menos, como o de serviços, comércio e construção civil.
Serviços
Das vagas abertas nos primeiros quatro meses de 2011, 47% estão no segmento de serviços (382.321), enquanto na indústria da transformação - setor que, segundo Mendonça, costuma pagar entre dois a três mínimos - o saldo positivo é 53% menor, de 179.066 vagas, que representam 22% do total do primeiro quadrimestre do ano.
No mesmo período de 2010, do total de vagas criadas, 36% foram geradas no setor de serviços (346.474), e 29% na indústria da transformação (287.443 postos). João Saboia, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em mercado de trabalho, afirma que nos últimos cinco anos, de cada três empregos criados, um foi gerado pela construção civil.
Além disso, segundo Alcides Leite, professor de economia da Trevisan Escola de Negócios, as empresas mantêm muitas alternativas fora da formalidade para contratar mão de obra especializada, porque o custo tributário desse trabalhador é muito alto. "A tentativa de fuga desses tributos sobre o trabalho é feita principalmente por parte do próprio empregado, por conta do Imposto de Renda", comenta Leite.
Novidade boa
Saboia, da UFRJ, lembra que esses movimentos não são novidade. "A novidade é o crescimento da geração de emprego com carteira assinada e a taxa de desemprego baixa. Isso é positivo." Os economistas também explicam que o efeito estatístico do reajuste do mínimo aumenta o saldo positivo nas faixas salariais inferiores, o que não é ruim do ponto de vista da formalização do mercado de trabalho e da consequente maior proteção que o trabalhador passa a ter com sua carteira assinada, além do ganho real de renda.
Mendonça observa que o salário mínimo, hoje em R$ 545, acumulou aumento 53% acima do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) desde 2003. Com reajuste de cerca de 14% do mínimo em vista para 2012, a fatia dos que ganham salários até dois mínimos deve engrossar ainda mais no próximo ano, o que, para os especialistas consultados, não é necessariamente uma situação negativa.
"O importante é que o salário mínimo vem crescendo acima da inflação, fazendo com que o piso também venha crescendo. Isso faz com que as pessoas vivam melhor, ajudando a corrigir o erro histórico de concentração de renda do país", defende Leite, da Trevisan.
Fonte: Valor Online